quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Novos Lares Novos Ares

Finalmente encontrei uma casa que julguei ser ideal. Tinha um estilo colonial com uma pequena varanda na entrada. Um jardim bem cuidado que rodeava toda a construção, e uma piscina nos fundos. Não era nem de perto tão grande quanto a que eu moro, e precisava de reforma. Eu queria tudo novo ali.


Clarissa me indicou uma arquiteta. Rhea Nasser era reconhecidamente uma das melhores do país. Eu dei as coordenadas, confessei meus mais profundos desejos. Fiz uma lista de tudo que eu queria para que fosse o lugar perfeito da minha futura nova família.


– Precisa de mais alguma coisa, Rhea? Faltou algum detalhe, ou tem alguma dúvida?

Ela sorriu com a minha preocupação.
– Não, Jack. Você me deu tudo que preciso. Vou fazer o orçamento, e assim que você aprovar, eu inicio o projeto.


– Está aprovado!
– Mas você nem viu os valores!


– Rhea, você é amiga da Clara, e tem um nome a zelar. Além do mais, eu estou com um pouco de pressa. Minha filha está se casando e eu deixei a casa pra ela. Não quero estar lá quando ela voltar da lua-de-mel.
– Está certo, Jack. Mas... Parece que existe outra urgência aqui também... Estou enganada?


Eu corei. Eu, Jack Miller, corei diante de um comentário tão natural. Porque eu sempre me surpreendia com as sensações que Aretha me causava?
– Rhea... Quanto a isso, eu queria te pedir... Sei que você é uma profissional respeitada, e também sei que figuras como eu enriquecem seu currículo. Mas gostaria de te pedir discrição neste momento. Não quero nenhuma revista anunciando essa minha aquisição.


– Hummm... A garota de sorte não sabe? – Deduziu ela acertadamente.
– Só sabe que estou procurando. – Eu estava vermelho outra vez. – Ela vem me perguntando o tempo todo se já encontrei alguma coisa. Mais por curiosidade mesmo do que por fazer planos eu acho.


– Só se ela for muito tola... – Rhea sorriu novamente e emendou: – Bem! Está certo, se o orçamento está previamente aprovado...
– Tem minha palavra.


– Então assim que o projeto ficar pronto eu te ligo pra apresentar, combinado?
– Ótimo. Em quanto tempo acha que consegue terminar?


– Ah, Jack... Meu escritório está lotado e...
– Rhea, eu imploro... Cobre o dobro, mas por favor, preciso de pelo menos um esboço até o fim desta semana. Porque ainda teremos as obras, enfim...


Ela pensou alguns segundos para responder:
– Ah, Deus do céu! Está bem eu vou fazer o possível.
– Obrigado, Rhea.


Encontrei Gabriel em casa quando voltei. Ele estava em seu quarto, encaixotando algumas coisas que não tinha levado para UNESim.
– Oi, Gabe...
– Fala, pai!


– Encontrei a casa perfeita pra gente! Mas não comente com Aretha. Quero fazer surpresa.
– Ah... Pai... – Ele ficou sem jeito. – Eu não vou me mudar com você...


– Não vai? Não vai por quê?
– Por zilhões de motivos... Mas o principal é porque eu não quero.


– Gabriel, meu filho, pra onde você vai? Eu te vejo tão perdido...
– Mais um motivo! Pai, olha pra minha vida. Eu amo música, estudo música mas não consigo me ver como concertista. Não quero ser “obrigado” a fazer música pra me sustentar. Eu faço por puro prazer, para relaxar, para entrar em êxtase. Se isso se tornar obrigatório, perderá todo sentido pra mim.


– Eu não tenho um emprego, eu não tenho uma profissão. – Continuou. – Eu preciso me encontrar! Se você me der permissão, eu gostaria de usar o dinheiro da previdência que você fez pra mim, pra viajar.
– Mas viajar pra onde, Gabe?


– Não sei ainda, mundo afora... Não encontrei nada aqui que eu quisesse fazer, pai. Quero conhecer outros lugares e outras culturas. Não sei o que estou fazendo, às vezes acho que não me encaixo.
– Gabriel, o dinheiro é seu... Mas se me perguntar, eu prefiro que você não vá...


– Pai! Sabe o quanto somos amigos... E parceiros! Mas eu sinto que preciso disso... E acho que não existe momento mais oportuno!
– Oportuno por quê? Agora que sua irmã está se casando e me deixando também...


– Porque você tem a Aretha, pai... Eu estou tranquilo de ir por que você não vai estar sozinho... E pai, eu não tenho destino, nem tenho prazos. Eu volto alguma hora que eu quiser, ou não volto, mas busco vocês... – E sorriu.


Ele tinha razão. Seria egoísmo meu prendê-lo aqui, enquanto planejava minha vida ao lado de Aretha. Mas claro que sempre contei com ele.
– Bem, eu acabei de falar com a arquiteta e seu quarto está no projeto. Ele estará sempre pronto, te esperando.


– Eu aceito um quarto de hóspedes, pai. Você pode ligar pra arquiteta e pedir que mude. Não deixe um quarto trancado pra mim. Se eu voltar a morar em SimCity, o que acho muito improvável, eu prefiro ter minha própria casa.


Foi um golpe duro. Difícil de suportar. Não que eu não compreendesse. Gabriel era adulto. Confuso, imaturo, mas um homem, com anseios de um homem. Eu não podia mais segurá-lo à revelia.
– Quando você vai?


– Vou terminar este semestre e trancar a faculdade. Vai coincidir mais ou menos com a data do casamento. Então eu parto. Estou planejando uma rota. Mesmo que eu não vá cumprir...
– Eduarda vai com você?


– Não pai... Isso não é algo que eu queira fazer com ninguém. Preciso ficar sozinho. Eu já conversei com ela... Ela entendeu, eu acho. Ou então também não liga, sei lá!
– Ah, Gabriel!


– Não pai... Isso não é algo que eu queira fazer com ninguém. Preciso ficar sozinho. Eu já conversei com ela... Ela entendeu, eu acho. Ou então também não liga, sei lá!
– Ah, Gabriel!


Passei alguns dias tentando digerir aquela notícia. Seria duríssimo ver meu filho partir novamente e pior ainda... Saber que estaria vagando sem destino certo, tentando se encontrar.


Foi então que outra notícia chamou a minha atenção. Eu tinha aberto o jornal justamente na sessão de fofocas do segundo caderno. Havia uma matéria com duas fotos, uma delas enorme de Ana aos beijos com um homem cujo rosto não estava aparente. A manchete dizia: Ana Vaz afoga as mágoas nos braços de novo “affair”.


O nome do cara não estava ali nem no leading e minha curiosidade me obrigou a ler a matéria até conseguir descobrir quem era do dono daquele rosto escondido.
“Após o fim do romance com o tecladista Jack Miller, quando foi trocada...”
– Que nojentos! – Pensei alto. – Como podem fazer isso com ela?


Continuei a leitura imaginando se Ana já tinha ciência daquilo.
“... quando foi trocada por uma garota 20 anos mais nova – filha da ex-namorada do músico – a Musa do cinema foi vista na noite de Roma atracada a mais nova promessa das pistas Londrinas. O rumor é de que o DJ Henry Donavan é um amigo comum da não menos diva e conceituada artista plástica Eve Wells.”


Só aí que reparei na foto menor, que me fez continuar a ler aquele absurdo todo.
“Eventualmente Eve tem sido flagrada em companhia de Herman Rivera, guitarrista da mesma banda de rock alternativo – os Hell’s Messengers – que seu amigo, Jack Miller. Coincidência?”
– Cretinos! – Xinguei sozinho.


Naquele momento o telefone tocou me fazendo quicar na poltrona com o susto. Era ela mesma, Ana. Estava lendo pensamentos agora?
– Ana! Oi... – Cumprimentei ainda aturdido.


– Pelo tom da sua voz acredito que já tenha visto o jornal... – Ela disse sem perder o humor.
– Não acredito que você não está nem um pouco chateada...


– Se eu for me incomodar com isso, Jack, eu não vou viver mais. É melhor eu me mudar pra Sibéria, ou pro Himalaia.
– Nisso você tem razão. – Ela de fato estava muito mais exposta, e portanto acostumada, do que eu. – Mas é tão injusto! Tanta mentira...


– Algumas partes, J. Mas não foi por isso que te liguei. Poxa! A Júlia vai casar! E você nem está histérico! Olha que máximo!
– Estou um pouco... Mas não posso perder a linha!


– Aposto que é mais pelo aumento da probabilidade de você virar avô a qualquer momento! Confesse!
– Não preciso... Você ainda me conhece muito bem... E já que eu não tenho o mesmo dom, nem bolinha de cristal, me responda... E você? Onde anda? Ainda em Roma?


– Estou... Essa é uma parte verdadeira, tá vendo? Mas já ajeitei minha agenda, e devo chegar aí alguns dias antes do casamento. A Jú tá por aí? Queria falar com ela...
– Ah, não... Ela saiu com a Aretha, para ver coisas de casamento. Agora é isso, todo dia, parece que o mundo vai acabar antes de tudo ficar pronto.


– Ah... – Ela se limitou a dizer, e eu me dei conta da minha rata. 
Provavelmente Ana desejava estar fazendo tudo isso junto com a Júlia. Sua agenda não lhe permitia.
– Tente o celular dela, Ana. – Sugeri, sem graça.


Aretha e Júlia só chegaram à noite. Aquele monte de caixas e sacolas espalhados pela casa estava começando a me oprimir. Eu me sentia encurralado.
– Vocês se incomodam se eu for caminhar um pouco enquanto vocês arrumam isso?
– Não... Tudo bem. – Disse Júlia. – O Reginaldo ajuda a gente com as coisas pesadas.


Agradeci e saí. Não tenho nenhuma paciência mesmo para aquilo. Fui caminhando até a praia, sem me preocupar com horário, mas percebi que já era tarde quando meu celular tocou. Eu não reconheci o número.


– Alô? – Atendi.
– Jack? É Rhea, tudo bem?


– Ah! Oi, Rhea! Tudo bem e você? Novidades? – Eu estranhei a hora, mas estava ansioso demais para não perguntar.
– Eu acho que o esforço valeu à pena... Tenho a sensação de que você vai gostar...


– Tenho certeza que sim, Rhea! Então, quando pode me apresentar?
– Ah, sim... Eu estava pensando... Você pode ver que já é quase meia noite e eu ainda estou no escritório... Foi assim a semana inteira por conta da urgência e da atenção que me você me pediu com tanto carinho... 


Enquanto Rhea falava, tentava adivinhar onde queria chegar. Ela estava dando voltas demais.
– Então eu acho muito justo que a gente resolva isso tudo num almoço amanhã. Pode ser?


Eu não esperava.
– Rhea... Errr... – Eu precisava negar. Ao mesmo tempo não queria ser indelicado. – É que a imprensa não tem sido muito boazinha comigo ultimamente, e... Você sabe... Ainda pretendo fazer surpresa a respeito da casa... Como vou explicar uma nota sobre um almoço com você, uma arquiteta tão conhecida?


– Quem foi que falou em restaurante? – Ela retrucou e eu gelei. Não sou ingênuo, embora não pudesse sugerir que ela estava me cantando. – Jonas, meu cozinheiro faz um sushi melhor que o de qualquer casa oriental. Que me diz?


Eu não encontrei uma desculpa razoável, a não ser pra mim mesmo: Eu estava com pressa.
– Tudo bem, Rhea. Que horas?
– Por volta de uma da tarde... Fica ruim pra você?


– Não. Uma hora tá bom. Me dá seu endereço...

Eu não queria acreditar, mas alguma coisa bem lá no fundo me dizia que, no final das contas, aquele orçamento talvez me saísse caro demais.


Começou assim que voltei pra casa e Aretha perguntou se eu podia pegá-la para almoçar justamente no dia seguinte. O motivo era que Alanis e Thales tinham ido a um novo restaurante e gostado muito. Ela queria experimentar.


– Amanhã? Amanhã eu não posso. – Eu devo ter gaguejado umas duas vezes. De qualquer forma, eu tinha certeza que ela me perguntaria.
– Tem compromisso amanhã? – É claro que era estranho pra ela. Eu estava sempre disponível.


– É... – Pensa rápido, pensa rápido! – É uma tarde dos “caras”, sabe? Eu, Herman e Gordo. Vamos comer, beber umas cervejas, jogar sinuca e talvez fumar uns charutos. – Exagerei. Acho que nem no nascimento do Gabe eu fumei charuto.
– Eca! Detesto charuto! Que nojo, J!


– É nojento mesmo... Mas homens fazem coisas nojentas, Anjo...
– Ai, Jack. Nem me conta, credo! Mas... – Ela vacilou. – Tio Herman não vai levar aquelas “amigas” dele não, né?


– Não, Aretha, já disse, somos só nós... E acho que Herman arrumou uma companhia bem melhor!
– Menos mal... – Falou distraída.


– Mas nós podemos jantar! – Tentei me redimir.
– Tá bom, então! – Ela respondeu inocentemente animada, fazendo com que eu me sentisse a pior das criaturas.


Eu puxei Aretha pra mim.
– Eu te amo muito, Anjo... Muito mesmo... Sabe disso, não é?
– Hummm, não sei... – Brincou com um sorriso lascivo. – Mas se você quiser me dar alguma prova agora... Eu tô aceitando...


Cheguei ao endereço que Rhea me deu, um pouco antes do horário marcado, no dia seguinte. Mas ela já estava me esperando, na beira da piscina. A arquiteta levantou para me receber.
– Oi, Jack. Tudo bem?
– Um pouco ansioso, Rhea...


Ela sorriu.
– Entendo... Os croquis estão bem ali no escritório. Preferia analisar de estômago cheio, mas se você está com problemas de agenda...
– Apenas ansiedade, Rhea, perdão. Podemos almoçar primeiro. – Eu me desculpei. Estava parecendo extremamente indelicado.


O Almoço transcorreu tranquilo. Algumas vezes tive a impressão de que Rhea estava “simpática” demais. Mas não posso fazer nenhuma afirmação. Ando com meus instintos um tanto descompensados desde que Aretha entrou de forma avassaladora em minha vida.


O sushi estava muito bom mesmo e eu já estava no meu terceiro copo de sake.
– Rhea... Podemos ver o projeto agora?
Ela sorriu com minha pressa:
– Vamos até lá em cima, então? Posso abrir melhor os desenhos na prancheta, do que nessa mesa molhada de choio.


Nós chegamos na sala-atelier e ela espalhou os papéis sobre a mesa de projetos. Estavam realmente bonitos. Pedi uma decoração clássica e fui atendido com um bom gosto impressionante! Era mais do que imaginei.


– Você que desenhou os móveis?
– Claro, Jack... Foi tudo feitinho com exclusividade pra vocês.


Nesse momento o tal do Jonas entrou no escritório trazendo outra rodada de sake.
– Errr... Estou satisfeito, Rhea, obrigado, se beber mais um destes não vou poder dirigir. – Além do mais eu estava exausto. Gastei uma energia considerável na noite anterior com Aretha, e como ela dormiu comigo, acordei muito cedo para levá-la ao Campus.
– Ah, mas que bobagem, para que temos tantas companhias de taxi nesta cidade?


Eu sou terrível tentando não ser descortês. Aceitei a quarta, a quinta e a sexta dose enquanto ela me explicava cada detalhe de cada canto da casa que havia desenhado.
Sorte que eu vi todos antes de minha cabeça começar a girar.


Em algum momento o telefone tocou, Rhea pediu licença para atender e saiu. Eu aproveitei para recostar nem que fosse por alguns poucos minutos. Desejei que Jonas entrasse naquela hora com uma garrafa d’água. Meus olhos fecharam e eu apaguei.


Demorei um pouco pra reconhecer o ambiente ao meu redor quando acordei. Até porque, já tinha anoitecido e não havia luzes acesas. Mas devia ter algum sensor de movimento, porque elas se acenderam sozinhas quando tentei me ajeitar na poltrona.


A vontade de urinar era enorme, eu sequer sabia onde era o banheiro. Comecei a entrar em pânico. Meu Deus, quantas horas eu fiquei apagado? Eu havia perdido o jantar com a Aretha?


Eu ainda olhava atônito ao redor, pensando se eu deveria sair pela casa da arquiteta procurando um banheiro, ou esperaria até que minha bexiga arrebentasse, quando Rhea entrou no escritório.
– Boa noite, “Bela Adormecida”!


Eu estava morto de vergonha.
– Rhea, te devo mil desculpas, mas antes, por favor, onde posso achar um banheiro?
– Descendo a escada, segunda porta.


Agradeci e voei pelos degraus. Tentava raciocinar enquanto me aliviava. Vi que eram oito da noite. Se eu corresse talvez ainda pegasse Aretha no Campus. Será que ela me ligou? Eu estaria tão pregado que não escutei nem senti o celular vibrar?
Lavei e enxuguei as mãos para pegar o telefone e constatar que não havia ligação alguma. Eu não deveria me preocupar. Ou deveria? Deus! Eu só faço bobagem!


Voltei para o escritório para me retratar com Rhea, se é que havia alguma maneira de fazer isso.
– Pronto Rhea, agora eu estou tentando resgatar alguma dignidade pra pedir desculpas por esse vexame.


– Ah, Jack, deixa disso. Você me pareceu cansado desde que chegou... Dormiu, e daí?
– Ah! Ainda bem que não ronquei nem babei na sua “Alesi Toronto RM45”.


Rhea sorriu levantando a sobrancelha.
– Ah, então eu ronquei! – Deduzi. – Pensei que você ficaria constrangida de me denunciar.
– Ei! Eu não disse nada! – Brincou.


– Sério, desculpe, Rhea, mas eu realmente tenho que ir. Está tudo perfeito, pode iniciar os trabalhos, o que precisar, fale comigo. Acha que termina antes do casamento?
– Eu aceito o desafio, Jack... Você está me pagando muito bem, imagino que saiba disso...


Passei em casa só para tomar banho e tirar aquela inhaca de bebida, depois acelerava em direção a UNESim. Achava estranho que Aretha não tivesse me ligado, nem que fosse pra cancelar o jantar, ou perguntar do meu sumiço. Ou talvez eu estivesse totalmente paranóico, e ela simplesmente não quisesse ficar me alugando uma vez que achava que eu estaria com o Gordo e o Herman.


Aliás, teria que ligar para eles, para que confirmassem a história toda em caso de necessidade. Nem sei se Herman está na cidade!
Para compensá-la do atraso resolvi fazer surpresa e não ligar. Parei rapidamente em um quiosque e comprei flores. Como se isso fosse me desculpar. Eu sou mesmo odioso.


Passei na casa dela primeiro. Mas estava tudo apagado, não havia ninguém.
Depois fui até as salas do Centro Técnico Científico, onde ela normalmente tinha aulas teóricas e de laboratório. Estava tudo meio sem movimento. Desci do carro e caminhei para o laboratório de Ciências Naturais, de onde vinha um dos poucos pontos de luz ainda acesos do CTC.


A porta do laboratório estava destrancada e eu resolvi entrar. Aretha estava mexendo animadamente num canteiro de plantas híbridas orgânicas, mas não estava sozinha. Tinha um cara com ela. É, um “cara”. Não parecia um aluno, a não ser que tivesse entrado tardiamente.


– Oi! – Eu cumprimentei enquanto me aproximava, porque eles não me notaram ali.

Aretha olhou primeiro, provavelmente reconhecendo a minha voz.
– Oi, J. – E abriu um sorriso.


Meu rosto devia ser de perplexidade, pois ela imediatamente emendou:
– Ah, Thomas, esse é o Jack, meu namorado. – A palavra ficava linda na sua voz. – Jack, este é o Thomas, meu monitor de biologia. Ele que me levou ao hospital, aquele dia, lembra?
– Claro! – Respondi. Como se fosse possível esquecer aquela noite! – Como vai, Thomas? Obrigado pela ajuda nesse episódio...


– Não foi grande coisa. Era para eu ter quebrado a cara dele, mas Aretha não me deixou! – Essa parte eu ignorava, devo ter feito uma cara de boçal.
– Você ia perder a Monitoria, Thomas, não valia à pena. – Ela justificou.


– Era pra esse desgraçado ser expulso! Não acha, Jack? – Ele estava perguntando pra mim?! Isso é da conta dele?!
– Nós já discutimos isso...! – Ponderou Aretha.
– É... Acho... – Respondi com pouco caso e voltei-me para Aretha. – A gente não ia jantar?


– Ué... Eu estava esperando você me ligar...

Eu estava incomodado. A tarde para ela deveria estar mesmo muito divertida para nem se preocupar em me ligar.


– Minha bateria acabou, por isso não liguei. – Menti.

O monitor sentiu o clima pesado. De minha parte, é claro.
– Eu tô indo nessa! – Despediu-se. Por mim, ele já estava demorando.


Thomas debruçou-se sobre Aretha e eu resfolguei. Era um abraço natural, não tinha nada demais, mas tive uma úlcera só de assistir ele encostando nela. Depois abriu um sorriso típico de comercial de pasta de dentes. Eu imaginei seu rosto desfigurado. Não sei por quê.


Ele saiu acenando. Eu não dei a menor atenção.
– Está tudo bem, J? São pra mim? – Ela perguntou vendo as flores na minha mão e confusa com minha reação.


– São. – Entreguei-lhe o buquê. – Desculpe meu atraso, Aretha. Eu me distraí e acabei perdendo a hora. Mas você podia ter me ligado. – Ela não tinha reclamado de nada. Mas eu estava inconformado dela não ter sentido minha falta.
– São lindas, J. Obrigada...


Como eu esperava uma resposta, ela continuou:
– Não ia adiantar muita coisa se seu celular está sem bateria... – Ela me pegou, sem nem mesmo saber. Que droga!

Não era possível que eu ainda não tivesse aprendido. Mentira é algo que nunca deu certo pra ninguém. Menos ainda pra mim, mesmo eu achando que havia algum bom motivo por trás.


– Você ainda vai querer jantar no tal restaurante? – Perguntei, já com indícios de mal humor.
– Hummm... Eu estou com fome e você?

Era incrível a inocência dela. Diretamente proporcional ao meu sentimento de culpa. Eu estava mentindo descaradamente e me roendo de ciúmes daquele estúpido monitor de biologia. Sem motivo nenhum aparente. 


– É... Estou... – Respondi secamente. – Você nem vai me perguntar porquê que eu demorei?
– Eu... Achei que você pudesse ter se distraído e perdido a hora. – Ela respondeu assustada com meu tom.
Meu Deus! Eu sou um grosso.


– Desculpe, Aretha... Pensei que encontraria você aborrecida porque eu sumi. Devia estar grato, no entanto...
– Eu te amo, Jack. – Ela me interrompeu, com um sorriso. – Já disse que confio em você.

Eu não a merecia.


Eu pouco falei durante o jantar. Além do mais, estava difícil digerir a comida com a imagem do tal do Thomas na minha cabeça. Meu estômago embrulhou. Eu nem podia avaliar se estava ou não gostando do restaurante que Thales e Alanis sugeriram.


– Júlia conseguiu falar com a confeiteira? – Ela perguntou para puxar assunto.
– Não faço idéia, Anjo.


– Eu ligo pra ela amanhã...

Eu não estava aguentando.
– Aretha... – Demorei. – Porque estavam vocês dois sozinhos no laboratório, àquela hora da noite?


– Eu estou fazendo uma pesquisa. Precisei esperar anoitecer pra observar uma reação. Thomas ficou pra me fazer companhia.
– Por quê?


– Como assim, “por quê”? Companhia... Para eu não ficar sozinha, ué!
– Mas qual o problema? Porque essa preocupação dele em você ficar sozinha?!


– Você não está com ciúmes do Thomas, está? – Perguntou desconfiada.
O nariz franziu, e eu não pude encará-la.
– Você não respondeu minha pergunta! E sim, eu estou mortificado de ciúmes!


Tamanha foi minha sinceridade espontânea que ela não segurou o riso.
– Thomas é meu amigo, J. Era meu vizinho quando eu morava com a minha mãe. Mas não o via há algum tempo, porque ele foi fazer mestrado no exterior. Agora voltou e está fazendo monitoria, até pintar uma vaga pra professor. É o que ele quer ser...


Eu não estava nem um pouco interessado em saber da vida do Thomas. Fiz cara de tédio.
– Ele só se tornou um pouco protetor após aquela história com o Rodrigo, Jack. Ainda mais porque pedi para ele não comentar com Thales... – Explicou.


– Você quer proteção? Eu arrumo um profissional pra você...
– Eu não quero um segurança, J, deixa de ser bobo...Você não precisa se preocupar comigo. Em relação a nada! Tudo que eu quero está bem aqui do que meu lado.



4 comentários:

  1. Ah.. minha vontade de bater em alguem volta quando vejo o J fazendo essas burradas... aushauhsuahs. Mesmo q seja por um bom motivo, pelo menos ele acha isso.. aff

    Agora a parte dele com ciumes da Aretha é muito fofa, meu também com um monitor lindo daqueles... XD~


    S2 S2 S2 S2 S2 S2 S2 S2 S2 S2 S2 S2 S2

    ResponderExcluir
  2. Ah.. minha vontade de bater no J quando o vejo fazendo essas burradas... lalalalala Ele pode achar que é um bom motivo, mas não existe bom motivo para mentiras! Só desculpas...

    J disse: "E acho que Herman arrumou uma companhia bem melhor!"
    Se eu fosse implicar com a Dindi eu diria: Não mesmo! Mas estaria esculachando a minha própria personagem... E realmente a Eve nunca daria em cima do J, mais por conta da amizade pela Ana!

    AMO!
    bjosmil! *.*

    ResponderExcluir
  3. Deixa q eu bato no J!!! s2

    Ah por falar em implicar... tinha até esquecido q a Ana feiosa tinha aparecido nessa atuh =P

    ResponderExcluir
  4. Hauhsaushuahs, meninas! Eurialto com vcs, viu!

    J merece apanhar é de muita gente! XD

    E a Ana só é feiosa no seu mundo encantado de faz de conta, Deh! Hauhsuahsuah!

    Obrigada!

    Bjks!

    ResponderExcluir